O Livro Imaginário |
|||
quinta-feira, janeiro 01, 2004 ( 1/01/2004 11:25:00 PM ) Ana Paula Oi minha querida! Que bom que um amor com cheiro de rua e perfume amadeirado te toma a alma. Há muito não te via tão leve. Quer almoçar hoje com o seu velho amigo? Preciso te contar umas coisas... O telefone fora arrancado imediatamente do gancho. Almoço? Claro! Almoço, sim! Ela iria almoçar com seu velho companheiro de tormentas, que agora parecia um parceiro de paz, também. Ela o conhecera em uma de suas piores fases. Ele parecia estar em outono o tempo todo. Sempre equilibrado. Sempre gentil. Ela chorava. Ele esperava. Ela reclamava. Ele sorria. Ela tinha crises. Ele estendia as mãos. Não podia negar um pedido de almoço a uma pessoa como ele. Nunca! - Onde nos encontramos? - No mesmo lugar. - Fechado Dessa vez não houve atraso. Às 13:00 eles se abraçavam. Véspera de feriado. Três pessoas dividiam o restaurante com eles. Ela sorria... - Nesta? - Não, aquele moço pode ouvir nossa conversa. - E aquela? - Aquela está muito perto da entrada. - Então, escolha... - Que tal aquela perto das flores. Elas parecem com você hoje. Sorridentes. - Ah! Que ótimo! - Você está realmente animada... - Estou. - O que a esperança de um amor não faz com uma mulher... - Até tu, Brutus? - De onde você tirou isso? - Sei lá, ouvi em algum lugar... - Meu Deus!!! Você realmente está leve. - Deus?! Você não é ateu? - Nunca fui! - Como não?!? - Nunca fui! Eu apenas não acredito na doutrina religiosa, mas acredito que exista algo transcendente sim. - Eu sempre pensei que você fosse ateu. - Por quê? - Ah! Você sempre condena quando a gente usa o nome de Deus para alguma coisa. - É que eu acho que não se deve usar o nome de Deus em vão. Afinal de contas, ele tem representatividade para os cristãos. - Mas você acabou de dizer Meu Deus!!! - Sim, eu estava invocando a presença do transcendente para agradecer a leveza da sua alma. - Então, o Meu Deus!!! Você realmente está leve foi um agradecimento e não uma exclamação... - Exatamente. - Você é cheio de mistérios. - Você nem imagina. # quarta-feira, dezembro 31, 2003 ( 12/31/2003 03:14:00 AM ) Ana Paula A manhã parecia acender o quarto. A luz atravessava as frestas com maior intensidade cada vez que ela abria os olhos. Havia tentado em vão escapar daquele interrogatório. O que fazer? Nem tudo na vida é perfeito, parecia se consolar. Parecia... Colocou os pés para fora. Respirou fundo e escorregou o resto do corpo pelo edredom azul e macio. Olhou para cama com ar enternecido, como se quisesse voltar. Antes que fizesse qualquer movimento, porém, o bichano miou à porta pedindo atenção. O dia gritava seu nome. Bom dia, meu bem. A caixa de e-mails estava vazia. Ainda assim rabiscou umas palavras para o amigo de olhos azuis. --O amor me toma a alma e tem cheiro de rua. Cheiro de encontro, de moeda caindo sob pés perfeitos, de cabelos desgrenhados e de sorriso cativante. O amor me toma o corpo e tem cheiro amadeirado. Cheiro de perfume suave que encontrei tocando o corpo enquanto em beijos me perdi. O que faço com esse amor que tem gosto, cheiro, nome e interrogação? Será que vai dar certo? Colocou o sonho em pausa. Esticou a mão, pegou o primeiro texto e encarou a realidade. Havia alguns poucos esperando por ela. Leu rapidamente, fez as devidas anotações e se pôs a caminhar pelo quarto recolhendo pertences e arrumando os pedaços de seu mundo que encontrava pelo caminho. - Posso entrar? - Pode, meu anjinho...venha aqui. - É verdade que você está namorando? - Quem te disse isso? - Mamãe. É verdade? - É sim. - Você vai me abandonar? - Claro que não, meu pequeno. Você será sempre meu irmãozinho do coração. - Mas não serei mais o único amor da sua vida. - Quando você crescer eu também não serei mais o seu. - Mas ainda é. - Vem cá...não fique assim. - Ele é bonito? - Eu acho. - Ele é legal? - É sim. - Ele te ama? - Eu espero que um dia ele me ame. - Por que um dia? - Por que ainda é cedo para dizer que o que ele sente é amor. - E o que você sente é amor? - Eu acho que é. - Então... - O quê? - Eu já fui abandonado... - Que é isso, pequeno! É claro que você não foi abandonado. - Ele me pagaria um sorvete de ameixa? - Ameixa? Eu pensei que você gostasse de chocolate. - Gostava quando tomava com você. - E não gosta mais? - Gosto quando for você e eu. - Humnn...Eu acho que ele pagaria um sorvete de ameixa. - Ele jogaria bola comigo e daria comida ao bichano? - Acho que sim, mas por que todas essas perguntas? - Ah! porque eu quero saber se ele te ama. - E ele só me amaria se fizesse isso? - Não... - Então... - Mas se ele cuidar bem de mim e do bichano é um bom sinal. - Onde você anda aprendendo isso, menino? - Naquele livro da mamãe... - Que livro? - Como saber se um homem te ama de verdade. - Você está lendo essas coisas? - Foi curiosidade... - Mas aquilo é muito ruim e amor não se mede dessa maneira. - Humnnn... - O que foi? - O abraço que você ia me dar... - Ah! Claro, vem cá pequenino. - Você me ajuda a fazer a tarefa de matemática? - Olha a exploração! - Ajude um pobre menino abandonado. - Meu Deus, que drama!!! - É só para ganhar o teu colo... - Você anda muito mimado. - A culpa é sua... # |
|